domingo, 23 de agosto de 2009

Afrodisíaco matemático

Do que gosto das férias é mesmo ter todo o tempo do mundo para ler...
Numa antologia de histórias reais do National Story Project da National Public Radio, organizada pelo Paul Auster cujo título é «Pensei que o meu Pai era Deus» encontrei esta história engraçada sobre a Matemática e o Amor :), que transcrevo:

Nos tempos em que John e eu rompíamos dia sim, dia não, tomámos a certa altura a decisão de manter uma relação aberta e descontraída. Podíamos sair juntos, mas não mais do que uma vez por semana. Íamos levar vidas separadas, encontrávamo-nos uma vez por outra quando estivéssemos para aí virados, mas sem nos preocuparmos com compromissos.
Certo dia, no início deste período de tréguas, estávamos os dois sentados no chão do apartamento do John. John estava a tricotar uma camisola para ele e eu lia Fermat's Last Theorem. De vez em quando, interrompia-lhe o tricô para lhe ler passagens do meu livro.
«Alguma vez ouviste falar de números amigos? São como números perfeitos, mas, em vez de serem a soma dos seus próprios divisores, são a soma dos divisores uns dos outros. Na Idade Média, as pessoas costumavam gravar números amigos na fruta. por exemplo, alguém que estava apaixonado por outra pessoa pegava em duas maçãs e gravava os números amigos. Depois comia a primeira maçã e dava a outra à pessoa amada. era um afrodisíaco matemático...»
John pouco ligou. Ele não morre de amores por matemática. Eu morro. Bom, aí estava mais uma razão para mantermos uma relação aberta e descontraída.
O Natal calhou durante este período e, como odeio fazer compras, foi com satisfação que risquei o nome de John da minha lista de prendas. A nossa relação era demasiado aberta e descontraída para nos sentirmos na obrigação de dar prendas um ao outro. No entanto, quando fui comprar a prenda da minha avó, dei com um livro de palavras cruzadas daquelas mesmo difíceis e comprei-o para o John. Nós sempre tínhamos feito as difíceis palavras cruzadas do The Nation e o livro também só custava 5 dólares, de maneira que achei que não havia problema em dar-lhe aquela prenda pelo Natal.
Veio o Natal e dei o livro ao John - sem embrulho nem nada, tudo muito aberto e descontraído. Ele não me deu coisa nenhuma. Não foi surpresa nenhuma para mim, embora tenha sentido alguma tristeza, o que, está bom de ver, não deveria ter acontecido, visto que, numa relação aberta e descontraída, tais coisas não têm a menor importância.
No dia seguinte, John convidou-me para o seu apartamento. «Tenho o teu presente de Natal», disse ele. «Desculpa o atraso».
Mal cheguei, entregou-me um pacote embrulhado às três pancadas. Quando o abri, caiu-me no colo um rectângulo tricotado à mão. Peguei nele e, apesar da confusão que sentia, tratei de apreciar a obra. Num dos lados tricotara o número 124155; no outro, o número100485.
Quando voltei a olhar o John, ele já não conseguia controlar a sua excitação.
«São números amigos», disse ele. «Fiz um programa de computador e deixei-o a funcionar durante doze horas. Estes números foram os maiores que encontrei. Depois tricotei-os em cima do que já tinha tricotado. É uma pega para os teus cozinhados. Não ta dei a noite passada porque não sabia como é que havia de rematar. É uma prenda um bocado pobrezinha, mas pensei que ias gostar...»
Depois desse Natal, John e eu fomos muitas coisas, mas abertos e descontraídos é que nunca mais. Não há dúvida: o velho afrodisíaco matemático continua a resultar.
Alex Galt
Porteland, Oregon

E, se não acreditam, o melhor é começarem a pesquisar sobre números amigos e comprarem maçãs... Não há nada tão excitante, cientificamente falando, como fazer experiências e observar ...
Boa sorte!

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